HERÓIS E VILÕES
O jornal Correio Braziliense, em sua edição de 31.05.2013,
traz matéria sobre pesquisa desenvolvida
por um “consórcio de pesquisadores” liderados por James Liu, da Victoria
University of Wellington, na Nova Zelândia.
A pesquisa, que segundo a matéria foi publicada pela revista
PloS One, consistiu em submeter a avaliação de 6727 estudantes universitários,
de 37 países diferentes (entre eles o Brasil),” o caráter de 40 grandes figuras históricas”.
A matéria do CB não fornece muitos dados sobre a pesquisa (número
de estudantes por país, número de figuras históricas por continente, quantos
países de cada continente foram pesquisados). Trata mais os resultados,
classificando os analisados em Heróis – os “do bem” – e Vilões – os “do mal”.
Independente do viés maniqueísta mais comum as histórias
infantis, a pesquisa colca algumas questões interessantes, seja pela
metodologia ou pelo seu conteúdo mesmo.
A – O resultado apontou como “Heróis”: 1) Albert Einstein;
2) Madre Tereza de Calcutá; 3) Mahatma Gandhi; Martin Luther King; 5) Isaac
Newtom. Como “Vilões”: 1) Adolf Hitler; 2) Osama Bin Laden; 3)
Saddam Hussein; 4) George W. Bush; 5) Joseph Stalin.
A primeira curiosidade é que, “heróis” e “vilões”, a
exceção de Newton, são todos do século
XX, isto é, são figuras dos tempos modernos, onde os registros históricos,
documentais e iconográficos são mais abundantes.
Chama a atenção que, na lista de “heróis”, o segundo,
terceiro e quarto sejam religiosos, sendo que Gandhi e Luther King
desempenharam papéis políticos fundamentais em seus países, tendo sido ambos
assassinados em razão da defesa que faziam de suas idéias, mesmo que Gandhi
tenha se destacado como um pacifista convicto e militante, assim como Luther
King também fosse contra a violência. E madre Teresa uma destacada lutadora
para amenizar a miséria. Quer dizer, no “conflito” ciência X religião esta
venceu por 3x2. Em pleno séc. XXI, numa pesquisa feita com universitários, é um
resultado surpreendente.
É importante notar que os religiosos que foram destacados
eram todos profundamente comprometidos com as lutas contra a pobreza/ miséria,
contra a violência/discriminação e na defesa dos direitos civis. Isso significa
dizer que eram todos religiosos convictos que sua religiosidade os levava a um
profundo compromisso com a vida plena, aqui e agora. Também mostra que a luta
contra as injustiças e mazelas sociais e a defesa dos direitos Humanos é sempre
vista como uma coisa admirável, louvável e digna de ser lembrada como uma ação humana
que se assenta nos corações e mentes das pessoas.
Outra curiosidade é
que nenhum político “tradicional” tenha feito parte da lista final. Será que
não tiveram seus nomes propostos para análise? Ou apenas não deixaram “marcas”
mais perenes aos olhos dos entrevistados?
Olhando para o resultado dos vilões a primeira coisa que
chama a atenção é que George W. Bush foi considerado mais malvado que nada
menos que Joseph Stálin. Será que o grande fantasma que assustava o mundo,
desde os tempos do “Manifesto Comunista”, já não é mais tão assustador assim?
Outra questão sobre os “do mal”: A maioria é, ou foram,
opositores do mundo de origem judaico/cristã/ocidental. A metodologia da
pesquisa (os nomes propostos) pode ter alguma responsabilidade. Ou será apenas
o resultado da visão de mundo que professamos e que se inculca como “verdade
absoluta” em todos os quadrantes?
Outro dado que a matéria do CB traz deve ser considerado com
atenção: das 40 figuras propostas para análise 16 são européias, 10 americanas
( de qual das Américas – norte, sul ou central?) 09 asiáticas e 04 muçulmanas.
Esse viés – de eurocentrismo ou norteamericanismo - deve sempre ser levado em conta em qualquer
análise. Como já o disse Michel Lowy, “os dados não estão dados. Os dados são
construídos”.
Portanto, ainda que a
visão maniqueísta do jornal seja também empobrecedora do debate, a pesquisa
traz elementos interessantes, ou talvez sejam mais interessantes os dados que
ela deixa de mostrar, pois só conhecendo o que não é mostrado a primeira vista
poderemos vislumbrar os reais heroísmos e vilanias da nossa história.