sexta-feira, 7 de agosto de 2015

HERÓIS E VILÕES

O jornal Correio Braziliense, em sua edição de 31.05.2013, traz matéria sobre pesquisa  desenvolvida por um “consórcio de pesquisadores” liderados por James Liu, da Victoria University of Wellington, na Nova Zelândia.
A pesquisa, que segundo a matéria foi publicada pela revista PloS One, consistiu em submeter a avaliação de 6727 estudantes universitários, de 37 países diferentes (entre eles o Brasil),” o caráter de 40 grandes  figuras históricas”.
A matéria do CB não fornece muitos dados sobre a pesquisa (número de estudantes por país, número de figuras históricas por continente, quantos países de cada continente foram pesquisados). Trata mais os resultados, classificando os analisados em Heróis – os “do bem” – e Vilões – os “do mal”.
Independente do viés maniqueísta mais comum as histórias infantis, a pesquisa colca algumas questões interessantes, seja pela metodologia ou pelo seu conteúdo mesmo.
A – O resultado apontou como “Heróis”: 1) Albert Einstein; 2) Madre Tereza de Calcutá; 3) Mahatma Gandhi; Martin Luther King; 5) Isaac Newtom. Como “Vilões”:  1) Adolf Hitler; 2) Osama Bin Laden; 3) Saddam Hussein; 4) George W. Bush; 5) Joseph Stalin.
A primeira curiosidade é que, “heróis” e “vilões”, a exceção  de Newton, são todos do século XX, isto é, são figuras dos tempos modernos, onde os registros históricos, documentais e iconográficos são mais abundantes.
Chama a atenção que, na lista de “heróis”, o segundo, terceiro e quarto sejam religiosos, sendo que Gandhi e Luther King desempenharam papéis políticos fundamentais em seus países, tendo sido ambos assassinados em razão da defesa que faziam de suas idéias, mesmo que Gandhi tenha se destacado como um pacifista convicto e militante, assim como Luther King também fosse contra a violência. E madre Teresa uma destacada lutadora para amenizar a miséria. Quer dizer, no “conflito” ciência X religião esta venceu por 3x2. Em pleno séc. XXI, numa pesquisa feita com universitários, é um resultado surpreendente.
É importante notar que os religiosos que foram destacados eram todos profundamente comprometidos com as lutas contra a pobreza/ miséria, contra a violência/discriminação e na defesa dos direitos civis. Isso significa dizer que eram todos religiosos convictos que sua religiosidade os levava a um profundo compromisso com a vida plena, aqui e agora. Também mostra que a luta contra as injustiças e mazelas sociais e a defesa dos direitos Humanos é sempre vista como uma coisa admirável, louvável e digna de ser lembrada como uma ação humana que se assenta nos corações e mentes das pessoas.
 Outra curiosidade é que nenhum político “tradicional” tenha feito parte da lista final. Será que não tiveram seus nomes propostos para análise? Ou apenas não deixaram “marcas” mais perenes aos olhos dos entrevistados?

Olhando para o resultado dos vilões a primeira coisa que chama a atenção é que George W. Bush foi considerado mais malvado que nada menos que Joseph Stálin. Será que o grande fantasma que assustava o mundo, desde os tempos do “Manifesto Comunista”, já não é mais tão assustador assim?
Outra questão sobre os “do mal”: A maioria é, ou foram, opositores do mundo de origem judaico/cristã/ocidental. A metodologia da pesquisa (os nomes propostos) pode ter alguma responsabilidade. Ou será apenas o resultado da visão de mundo que professamos e que se inculca como “verdade absoluta” em todos os quadrantes?
Outro dado que a matéria do CB traz deve ser considerado com atenção: das 40 figuras propostas para análise 16 são européias, 10 americanas ( de qual das Américas – norte, sul ou central?) 09 asiáticas e 04 muçulmanas.
Esse viés – de eurocentrismo ou norteamericanismo -  deve sempre ser levado em conta em qualquer análise. Como já o disse Michel Lowy, “os dados não estão dados. Os dados são construídos”.
 Portanto, ainda que a visão maniqueísta do jornal seja também empobrecedora do debate, a pesquisa traz elementos interessantes, ou talvez sejam mais interessantes os dados que ela deixa de mostrar, pois só conhecendo o que não é mostrado a primeira vista poderemos vislumbrar os reais heroísmos e vilanias da nossa história.